segunda-feira, março 24, 2008

 

BALIZAS

Hoje acordei agitada. Quando me perguntam porque não escrevo mais, respondo que só consigo fazê-lo quando já não me cabe dentro. Pois hoje, não coube. Mas, sem que pudesse fazer nada para contê-lo, saiu-me o conteúdo por todos os poros. Extravasou como acontece ao leite do fervedor naquele segundo em que nos viramos para agarrar na pega. E o que fica no fogão não serve para nada. Só para dar trabalho a limpar.

Devo ter ficado tão desalentada que a força suprema que me rege e orienta, fé que tenho incondicional, levou estes dedinhos e estes olhinhos, a dar com um texto maravilhoso. Foi-me directo ao coração. Deixo-vos um bocadinho, aquele que gostaria de ter escrito eu. Mas vão ler o resto.

Desde aquela altura em que fui viver sózinha, demasiado cedo, que percebi que se perdesse algumas rotinas perdia-me a mim. Precisava delas para darem lastro à minha vida e para, apoiada nelas, poder fazer todas as loucuras que achava que tinha e podia fazer. Por mais perdida que andasse nunca jantei sem ser de mesa posta, nunca bebi um chá sem pôr um pires por baixo da chávena, nunca comi peixe com talheres de carne. Pormenores? Não, rotinas que nos seguram, por pequenas e fúteis que sejam. Posso tergiversar (esta é uma das minhas palavras preferidas) em muitas coisas, mas tento manter alguns padrões na minha vida para não me sentir completamente perdida. Aprendi, à minha custa, que se questiono todas as regras fico sem regras nenhumas e perco-me definitivamente. Assim, vou-me segurando no que parece que não tem importância, mas que tem a importância de me fazer sentir pertença de um lugar e de alguém.

quinta-feira, março 20, 2008

 

CARAMBA!

A vida tem-me dado de surpresa tantas coisas que eu já devia saber lidar com o inesperado.

segunda-feira, março 17, 2008

 

POSTE DEDICADO *

Há muito tempo, quase ainda adolescente, li um livro da Patricia Highsmith que tem, em português, o título "As Pessoas Que Nos Batem à Porta". Nos últimos anos, tem-me vindo à ideia, repetidamente, essa frase, embora num contexto um pouco diferente daquele a que se refere a autora. No livro, ela fala dos vendedores, tão americanos, típicos dos anos 50-60, penso eu, que percorriam aquele imenso país a vender de tudo: avon, aspiradores, seguros... Na minha vida, a porta é um pouco mais simbólica, mas, no meu quadro de referências de memórias e sentires, acaba por ir dar ao tal título.

Há 4 anos, desataram a bater-me à porta. Durante muito tempo, tempo demais por ser tempo contra mim, contra o que sou, vivi sem porta onde alguém pudesse bater. Ou porque era tão espessa, de interior em lã de aço, que impedia a passagem de qualquer som ou porque, simplesmente, não existia. Nada interposto entre mim e os outros. Que, na prática, dá exactamente no mesmo. E imagino-me de olhos vítreos a vê-los, através deles, adormecida para os estímulos. Tal como estava alheia a tantas coisas. Porque, e ainda bem, temos um mecanismo de homeostase interna que, apesar de tudo, vai funcionando mesmo em momentos críticos, para não nos deixar alienar de todo.

Depois, de repente mas com aviso (que fui sentindo como um desentorpecimento nas entranhas), comecei a ouvir uns sons. Ainda não era gente - "que gente não bate assim" - mas já era vida. E desataram a entrar-me pela casa, eu com a porta já só tão encostada, que qualquer leve bater a abria. E, com o meu pedaço de céu, entrou um batalhão de anjos, seus guardiães e, agora, também meus.

Hoje, já tenho a porta fechada de novo. Só no trinco e é de madeira nobre. Serve muito bem a sua função. Estabelece a fronteira entre mim e o mundo mas deixa-me ouvir tudo o que se passa na rua. Abro-a quando quero e, às vezes, encontro alguém que ainda não bateu mas estava a pensar nisso. Outras vezes ouço bater e deixo o coração decidir da minha disponibilidade. Tem sido muito bom. Mas de tudo o que a minha porta já me proporcionou, há momentos que são tão especiais que me enchem de luz: quando qualquer coisa me diz que tenho de franquear a porta e, do outro lado, está alguém para RE-conhecer.

* já não me lembrava o quanto gosto de ver nascer o dia

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