segunda-feira, junho 26, 2006

 

A FÉ

"A fé é aquilo que nos toca incondicionalmente". Aqui está uma definição de que gosto muito. Infelizmente, como excelente calona que sou, não sei quem é o seu autor. Devia sabê-lo, até porque tenho responsabilidades na área. Dos autores, não da fé. Ou tenho só da minha. Que, atrevo-me a dizê-lo, não há nada de mais pessoal, de mais íntimo, de mais único de cada indivíduo. Porque cada um é tocado de maneira diferente, ainda que se reconheçam idênticas manifestações.

Eu tenho fé em muitas coisas. Acho que por uma questão de organização do meu espaço mental. Porque, se pensar bem, é uma única Fé, que é a minha. Permanentemente comigo, mesmo quando me desespero. Porque nunca perco a esperança. E isto lembra-me que vou gostar de escrever sobre a diferença entre o desespero e a desesperança. Mas não agora.

Parece-me ser a falta de fé um sentimento muito generalizado. É, pelo menos, essa a minha convicção, decorrente do que vou observando e ouvindo. Tenho para mim que a maior parte das pessoas que se queixa desse "estado" não valoriza muito do que sente. Às vezes, porque se tem a mania (ou o hábito) de procurar aquilo se julga excelente, desdenha-se o corriqueiro, o banal. O ordinário. Palavra mal conotada, não é? Mas tem também o significado daquilo que ocorre regularmente. Nessa medida, ter a "fézada" de que no próximo fim-de-semana vai estar bom para a praia é menos nobre do que ter fé na humanidade?

Acabei por pensar nisto a propósito de um encontro que tivemos no sábado no arraial. Tenho um carinho muito especial pelas meninas do "Oxalá". Por várias razões que, tenho fé, lhes contarei de viva voz um dia. Li que elas viriam a Lisboa e disse à Ana que lhes mandaria um mail para combinarmos encontrar-nos para nos conhecermos. Como sempre, deixei passar os dias e não fiz nada. No entanto, estava certa de que iríamos mesmo conhecer-nos. Quando lá chegámos, a Bifa (que até não é nada céptica, bem pelo contrário) dizia-me, com um ar de proooonto, Maria: "Como queres encontrar-te com elas se não combinaste nada?". Acresce o facto de que, este ano, era praticamente impossível circular no recinto da festa e quem lá esteve sabe bem do que falo. Não interessam os pormenores, ainda que cada um deles tenha concorrido para confirmar o que eu sabia inevitável. Mantive-me toda a noite no cerca de metro quadrado livre que encontrei. E, por volta das 2 da manhã, a Ana que tinha ido buscar bebidas com outra amiga, toca-me no ombro e diz-me "Olha quem te trago aqui." É sempre assim. Simples. Bom. Tranquilo. Feliz. E altamente motivante.

ps.: deixem-me dizer-vos que o sorriso da Lu tem o sol todo do Algarve lá dentro.

sexta-feira, junho 23, 2006

 

CARTA ABERTA A UMA AMIGA (DE CABEÇA) MUITO PERDIDA

Do que vem de ti, desde que para mim, aceito tudo. Aceito que não me incluas na lista dos amigos que chamas a partilhar o teu dia de anos, que acredites nas patranhas que te contam, que te deixes pobremente manipular. Como há mais de 20 anos aceitei que decidisses que o meu lugar era em frente ao fogão a fritar bifes de empreitada e a mexer o arroz dos leões da Rodézia.

Agora o que me custa mesmo a ultrapassar, é essa tua incapacidade de te olhares por dentro. De reconheceres em ti e para ti, os verdadeiros motivos que te fazem agir de forma tão inconsequente. Ainda só sabes viver assim, de faz-de-conta? Da parte mais exterior das palavras e dos pensamentos? Da casquinha brilhante, tão certinha, laca perfeita para uma vida de ilusão? De verdade que não tocas a tua essência? Foges de quê? Ou não queres mesmo mais? Acreditas sempre no que te dizem? Como acreditas no que dizes aos outros? Ou nem te perguntas?

Continuo a ser tua mãe. Este amor que te tenho é incondicional. Só assim se explica a dor que me tolhe a alma quando te sei a tropeçar de novo. De que, mais uma vez, levaste à cena a tua farsa pessoal. Não imaginas o que custa.


Nota: hoje, só hoje e por causa deste post, senti o poder de ter um blog. A suprema satisfação, quase perversa, de tornar pública uma dor sem ter de explicar nada. Acho que, a partir de agora, vou tratar este cantinho com muito mais respeito.

terça-feira, junho 20, 2006

 

FILHO(A) DA PUTA? FILHO(A) DA CULPA!

Uma das maiores aprendizagens que a vida me proporcionou foi a capacidade de distinguir culpa de responsabilidade. Custou-me um bocado a perceber a diferença mas infinitamente mais difícil foi operacionalizá-la, colocá-la em prática no meu quotidiano. É que é bem mais fácil ser culpado do que responsável. "A culpa morreu solteira", diz-se. Eu acrescento: e estéril, seca que nem um galho morto. Podemos sempre escudar-nos atrás da culpa. Aparente paradoxo, este. Mas, na realidade, não há melhor defesa que a culpa. Não serve sempre de atenuante a sua assumpção? Sou um pouco menos criminosa se for confessa. Se assumir a culpa dos meus crimes. Hediondos que sejam. Gera-se um movimento solidário de compreensão. Identifica-se o agredido com o agressor num terreno que é de todos, porque para lá remete toda a nossa moral. E ainda posso pedir desculpa. E ela pode ser-me concedida. O que, de caminho, permite à vítima exercer o supremo direito de perdoar. Sabe tão bem!... Mas, já me dizia a minha mãe deixando-me totalmente consternada, encurralada, sem alternativas, "desculpa não cura ferida".

Acho (agora, 3 dezenas de anos depois) que o que ela me queria dizer era que o facto de se assumir um erro não tem qualquer efeito no que já aconteceu. E que, por causa disso, não adianta nada. A não ser, claro, os efémeros prazerzinhos de se ser desculpado e se desculpar. Que, parcos de consistência, são tão-somente… nada!

Ao considerar a minha culpa, saldo as contas e demito-me de quaisquer outras obrigações. Fico, também eu, uma vítima: dos meus instintos, dos meus impulsos, da minha má formação, da minha ambição desmedida, do meu supremo desprezo pelo bem-estar alheio... E pronto! E chega?

Para mim, já não. Nem me chega ser assim nem admito que o sejam comigo. Não quero saber da culpa. Não sinto nenhuma. A sério. Foi-se. Todinha. Mas no seu lugar apareceu outra coisa nova, muito mais difícil de gerir. Por definição, ser-se responsável significa "responder por". Na prática, implica assumir os actos e as suas consequências. Estar pronta a arcar com todos os danos que advierem das minhas escolhas. Ao contrário da culpa, não nos sentimos responsáveis. Ou somos ou não. Implica acção, atitude activa. Envolvimento no processo. Do qual nunca sou vítima por não ocorrer à minha revelia, antes de acordo com a minha vontade.

Quando se começa a funcionar assim, nunca mais nos permitimos ser de outro modo. A nossa responsabilidade não deixa.

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