terça-feira, junho 20, 2006

 

FILHO(A) DA PUTA? FILHO(A) DA CULPA!

Uma das maiores aprendizagens que a vida me proporcionou foi a capacidade de distinguir culpa de responsabilidade. Custou-me um bocado a perceber a diferença mas infinitamente mais difícil foi operacionalizá-la, colocá-la em prática no meu quotidiano. É que é bem mais fácil ser culpado do que responsável. "A culpa morreu solteira", diz-se. Eu acrescento: e estéril, seca que nem um galho morto. Podemos sempre escudar-nos atrás da culpa. Aparente paradoxo, este. Mas, na realidade, não há melhor defesa que a culpa. Não serve sempre de atenuante a sua assumpção? Sou um pouco menos criminosa se for confessa. Se assumir a culpa dos meus crimes. Hediondos que sejam. Gera-se um movimento solidário de compreensão. Identifica-se o agredido com o agressor num terreno que é de todos, porque para lá remete toda a nossa moral. E ainda posso pedir desculpa. E ela pode ser-me concedida. O que, de caminho, permite à vítima exercer o supremo direito de perdoar. Sabe tão bem!... Mas, já me dizia a minha mãe deixando-me totalmente consternada, encurralada, sem alternativas, "desculpa não cura ferida".

Acho (agora, 3 dezenas de anos depois) que o que ela me queria dizer era que o facto de se assumir um erro não tem qualquer efeito no que já aconteceu. E que, por causa disso, não adianta nada. A não ser, claro, os efémeros prazerzinhos de se ser desculpado e se desculpar. Que, parcos de consistência, são tão-somente… nada!

Ao considerar a minha culpa, saldo as contas e demito-me de quaisquer outras obrigações. Fico, também eu, uma vítima: dos meus instintos, dos meus impulsos, da minha má formação, da minha ambição desmedida, do meu supremo desprezo pelo bem-estar alheio... E pronto! E chega?

Para mim, já não. Nem me chega ser assim nem admito que o sejam comigo. Não quero saber da culpa. Não sinto nenhuma. A sério. Foi-se. Todinha. Mas no seu lugar apareceu outra coisa nova, muito mais difícil de gerir. Por definição, ser-se responsável significa "responder por". Na prática, implica assumir os actos e as suas consequências. Estar pronta a arcar com todos os danos que advierem das minhas escolhas. Ao contrário da culpa, não nos sentimos responsáveis. Ou somos ou não. Implica acção, atitude activa. Envolvimento no processo. Do qual nunca sou vítima por não ocorrer à minha revelia, antes de acordo com a minha vontade.

Quando se começa a funcionar assim, nunca mais nos permitimos ser de outro modo. A nossa responsabilidade não deixa.

Comments:
brilhante!
 
Brilhante e genial! Dá-me vontade de imprimir e emoldurar! Ganda Maria Carolina!
 
Oh Nina... tu és um amor!
 
Eu peço desculpa, mas a responsabilidade não é minha de não estar ao corrente dos motivos que te levaram a escrever tão interessante peça. É óptima leitura de reflexão pelo que acho que estou perdoado também por estar a comentar em seara alheia. assim, vítima e à revelia da sua autora deixo-lhe aqui um grande beijo.
 
magnífico!

eu cá nunca compreendi a máxima "quem diz a verdade não merece castigo"... mas que raio tem o cú a ver com as calças!!

Eu sou a favor da responsabilidade!
 
Maria Carolina...uff...falta-me o ar e ao mesmo tempo senti uma lufada de ar fresco a entrar na minha consciência...puxa!...
Só espero que para o teu último parágrafo não haja excepções!...
Um beijo enorme, daqueles repletos de TUDO, e estou pronta para assumir a sua responsabilidade perante a tua cara metade
 
Enviar um comentário

<< Home

This page is powered by Blogger. Isn't yours?



eXTReMe Tracker