terça-feira, novembro 23, 2010

 

A MORTE

Ontem vi-me, pela segunda vez na vida e no espaço de menos de um ano, perante a situação de ter de decidir como alguém, que não eu, vai morrer.

Até aos 30 anos, a morte - a minha morte - nunca me assustou. Descobri, depois, que a morte só mete medo aos muito infelizes ou aos muito felizes. Porque, abençoadamente, a partir de certa altura na vida, encontrei-me entre os segundos. E desatei a ter medo de andar de avião. De morrer no bloco operatório. De ter um AVC ou de tropeçar nas escadas e fazer um traumatismo craniano...

Aos muito infelizes - não aos muito tristes - também os atormenta a morte. Só é muito infeliz quem não tem nada dentro e, esse vazio, extravasa o corpo e prolonga-se no espaço, impedindo qualquer ideia de transcendência.

Já aos muito tristes, a morte aparece sedutora, misteriosa princesa das arábias envolta em sete véus, promessa de deleites e prazeres nunca vividos, de mundos a descobrir. É difícil resistir à tentação. Que é da carne e do espírito. Que só querem que a alma descanse em paz.

Devíamos poder decidir sempre. Devíamos, enquanto ainda sãos de mente, deixar inequivocamente clara a forma como queremos morrer, caso a morte não nos interpele de surpresa. Ninguém deveria ser obrigado a fazê-lo por nós. Mas, sobretudo, sobretudo, sobretudo, devíamos encarar esse acto como a expressão máxima e definitiva da nossa liberdade e auto-determinação.

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